Sunday, November 09, 2008

Muito pior que um besteirol americano



Jason Friedberg e Aaron Seltzer são dois diretores e roteiristas de comédia cujas maiores influências, imagino, devem estar naqueles nonsenses que marcaram época no cinema americano dos anos oitenta, trabalhos de Jim Abrams, David Zucker, como Top Gang, Aperte os Cintos que o Piloto Sumiu, ou Corra que a Polícia vem aí, uma linha, aliás, derivada de um estilo cômico desenvolvido na Grã-Bretanha em meados de 70 por gênios como o pessoal do Monty Python Flying Circus. Seus filhotes oitentistas americanóides nasceram com o selo Hollywood do fast delivery e da cultura de massa que demanda piadas de entendimento fácil, instantâneo, sem rodeios verborrágicos, reflexões ou referências de cunho erudito. Ainda assim, apresentavam uma qualidade apreciável que, pelo menos até certo ponto, justificava a paternidade. Décadas transcorreram e uma nova geração de roteiristas e diretores assumiu o poder da máquina, uma geração que aprendeu a fazer graça com Abrams e Zucker, mas também com o Saturday Night Live, em seus altos e baixos, e, mais recentemente, com o não tão criativo Mad TV, entre outras bobagens de igual calão. Friedberg e Seltzer estão nesse grupo, as cópias das cópias das cópias (e, lembremos, falo aqui de gravação analógica, como nas fitas cassete, em que uma parte da qualidade se perde durante o processo), o eco do eco do eco, a reverberação difusa, careta e inofensiva do que um dia foi iconoclastia de gente grande. Se os Pythons procuravam na filosofia, na política e na história as referências geradoras para seu material, "gênios" como Friedberg e Seltzer têm na MTV, Reality Shows, comerciais e sitcoms de baixa qualidade, a principal inspiração de suas piadas. Duro de Espiar, trabalho de estréia da dupla escrevendo, não chega a ser ruim. Bem abaixo dos grandes sucessos de Leslie Nilsen, é verdade, mas ainda capaz de arrancar risadas (minhas, pelo menos). Depois disso, os dois tiveram a chance de aprender algo (seria possível?) integrando o time de roteiristas de "Todo Mundo em Pânico 1 e 2", outros netos bizonhos da geração Python, filmes que determinariam o modus-operandi da próxima "dinastia nonsense parodia" em Hollywood. O pior disso tudo é que nem igualar o nível destes dois filmes este pessoal tem conseguido. As seqüências da franquia são inócuas, ainda que uma delas contasse com a participação de Zucker, hoje uma sombra do que foi no passado. Os trabalhos subseqüentes da dupla Alka Seltzer/Friedberg (dessa vez escrevendo e dirigindo) são uma piada pronta onde a graça está na incompetência da dupla, que, como outros de sua estirpe, acha que fazer comédia é juntar um punhado de referenciais pop e expor sua ridicularidade essencial à ridicularidade cômica pelo método infanto-pastelão. O problema ocorre quando constatamos que a ridicularidade da paródia pertence à mesma árvore genealógica da ridicularidade a ser parodiada, ou seja, lixo lixificado a uma audiência nascida do dejeto, a nadificação do nada para ninguém ver. Não há vestígio de inteligência, criatividade, originalidade ou bom senso no mecanismo cômico de Os Espartalhões, Date Movie, Disaster Movie e outros tantos blockbusters-paródia sem sustância, sem razão de ser, sem algo que justifique sua existência como filme. São a versão nonsense dos "Gigolôs Americanos" e "Norbits" da vida. E não me venham os porta-vozes do cinema decerebrado defender esses filmes como diversão despretensiosa. Despretensioso era Porkys, Última Despedida de Solteiro, Eu, Eu Mesmo e Irene, Debi & Loide... As produções sobre as quais escrevo estão aquém do despretensioso, aquém do decerebrado, do besteirol, da diversão fugaz, são a derradeira distorção dos fundamentos da sátira e da paródia. Se a paródia visa profanar a aura intocável de um ícone, temos aqui a profanação do próprio papel da paródia, e, de certo modo, a relegitimização do mecanismo que ela pretendia atacar e do falso ícone que ela deveria expor.



Por essas e outras, na hora de escolher entre comédias pós-modernas, fico com outras correntes, com os "despretensiosos" mais sagazes, com a galera do Superbad ou do Tropic Thunder, que sabe ser criativa e fazer jus a seus antecessores, mesmo quando quer sacaneá-los.

1 comment:

Unknown said...

Nada como aprender a rir de si mesmo e não se levar a sério! Assino embaiox deste seu ótimo comentário. Penso o mesmo!

Abs!